
Contos africanos de ficção especulativa, inéditos em português, agora estão íveis ao público brasileiro graças a um projeto colaborativo de tradução que envolveu professores e estudantes de diferentes regiões do país.
A proposta partiu de um grupo vinculado ao curso de Letras da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS), que se dedicou à tradução de textos publicados na Omenana: Speculative Fiction Magazine, revista africana dedicada a obras de fantasia, ficção científica e terror.
O objetivo do grupo foi ampliar o o a uma produção literária pouco difundida no Brasil, marcada por narrativas que exploram mitologias próprias de países como Nigéria, Quênia e Tanzânia.
Os textos traduzidos trazem visões de mundo singulares, muitas vezes permeadas por elementos espirituais e culturais locais — um contraponto ao padrão eurocentrado predominante nesse gênero.
Novas vozes e outras mitologias
As histórias traduzidas rompem com o imaginário convencional da ficção especulativa, geralmente associado a fadas, duendes ou futuros distópicos do Ocidente. Os personagens e universos retratados nesses contos partem de referências culturais africanas e trazem uma abordagem diferente sobre ciência, espiritualidade e cotidiano.
Durante o processo, o grupo identificou diversas conexões com a realidade brasileira, especialmente na forma como temas como religiosidade e conhecimento popular se entrelaçam com a ciência.
Para o coordenador do projeto, o professor Elton Furlanetto, o trabalho representa uma oportunidade de criar pontes culturais. “São autores que não chegam por vias tradicionais, como editoras ou programas de literatura. Esse projeto é uma forma de tornar visível uma produção que, de outra forma, aria despercebida”, explica.
Da teoria à prática da tradução
Mais do que a publicação dos contos, o projeto serviu como espaço formativo para estudantes da graduação. Boa parte dos textos foi traduzida em duplas, com discussões sobre escolhas linguísticas, adaptações culturais e decisões técnicas, como a conversão de medidas e o tratamento de expressões idiomáticas.
“Cada participante tem uma maneira de traduzir. Comparar versões e justificar escolhas é um exercício importante. A tradução literal, muitas vezes, soa estranha ou imprecisa. Por isso, buscamos sempre preservar o sentido e a fluidez do texto original”, detalha Furlanetto.
A equipe se reunia quinzenal ou mensalmente para oficinas práticas, onde também traduziam trechos de romances e poemas.
Reconhecimento e próximos os
O grupo chegou a pedir autorização à Omenana Magazine para traduzir parte do conteúdo em uma edição comemorativa de dez anos. A própria revista apoiou a iniciativa e viabilizou o contato com os autores, liberando os direitos de forma gratuita.
Para o futuro, o grupo já tem novos planos. Uma das ideias é traduzir textos do livro The Feminist Utopia Project, que reúne mais de 50 narrativas e entrevistas sobre futuros possíveis com protagonismo feminino.
Outra possibilidade envolve o trabalho com obras em domínio público, ainda não traduzidas, de autoras e autores falecidos há mais de 70 anos.
*Com informações da UFMS